Com o compromisso de educar as gerações de brasileiros para os desafios do futuro, a Editora Moderna completa 50 anos de uma rica trajetória.
Aos 90 anos de idade, o fundador da editora, Ricardo Feltre, explica como a Moderna atravessou todos os períodos de instabilidade no Brasil nestas cinco décadas, para se firmar como referência em livros didáticos no país.
Confira trechos da entrevista de Ricardo Feltre à revista EDUCATRIX:
- - Como nasceu a Moderna?
Ricardo Feltre - A Editora Moderna foi fundada em 22 de outubro de 1968 pelos professores Carlos Marmo, Setsuo Yoshinaga e por mim. Nós dávamos aulas em um cursinho pré-vestibular. Na época, os cursinhos não tinham apostila.
Nós três já produzíamos material para nossas aulas. Então, pensamos: se funciona e os alunos gostam, por que não transformar em livro? Yoshinaga e eu fizemos o volume 1 de um projeto de Química em quatro volumes, que depois passamos para três, um para cada ano do Ensino Médio. Vendemos os primeiros exemplares meio experimentalmente, mas logo percebemos o potencial. Então fundamos a Moderna para legalizar as vendas dos livros.
E - O senhor considera que o livro didático da Moderna foi uma inovação na época?
RF -Em geral, as escolas não tinham esquadro, mapas, projetor, essas coisas. O material era essencialmente o livro didático. Desde o primeiro livro, a nossa preocupação foi não exagerar no conteúdo. Houve uma preocupação genuína para dividir os conteúdos em blocos coerentes, que fizessem sentido e fossem intercalados com questionários. A principal inovação, se assim podemos chamar, foi a inclusão de uma quantidade maior de exercícios de fixação. No caso da Moderna, outra novidade foi a organização em três volumes, um para cada ano do Ensino Médio. Hoje parece óbvio, mas na época foi uma inovação e tanto.
E- Como era o processo de criação de um livro didático há 50 anos?
RF - Em qualquer editora, o caminho desde a ideia inicial até a materialização do livro é longo e passa por etapas essenciais: acertar o assunto de interesse dos leitores/professores; ter autores competentes; ter colaboradores experientes e atualizados com as necessidades do mercado, que editem o texto inicial e adequem aos alunos; elaborar um projeto gráfico atraente; consolidar formatos e a qualidade da matéria-prima etc. Enfim, ter em mente uma série de atributos que torne aquele livro indispensável na visão dos professores – nossos maiores parceiros na adoção dos materiais didáticos.
Em termos da produção e distribuição, as mudanças são gigantescas. Quando a Moderna nasceu não existia computador, era tudo feito à mão, os recursos gráficos eram limitados. Essa transição contou muito com a entrada dos meus filhos Ricardo Arissa Feltre e Eduardo Arissa Feltre na equipe de colaboradores.
Dessa época, eu lembro bem do Eduardo dizendo: “Vamos fazer tudo no computador”. Eu dizia “Eduardo, não dá”. Ele insistia e, então, a gente brigava. No final, o tempo provou que o Eduardo estava certo.
E– Como foi a consolidação da Moderna no mercado brasileiro?
RF - A década de 1980 foi generosa com a Moderna. A empresa se consolidou e ficou conhecida e respeitada em todo o país, tanto no segmento de didáticos quanto na literatura infantojuvenil.
E - Quais foram as principais crises que a Moderna enfrentou?
RF - A primeira crise foi o choque no preço do petróleo, que entre 1973 e 1974 subiu de US$3 para US$12. Isso se refletiu, na mesma proporção, no preço do papel para impressão gráfica.
Mas sobrevivemos, com o grande esforço de nossos colaboradores internos e o apoio dos parceiros externos.
Outro golpe violento veio em 1990, quando o Collor, imediatamente após a sua posse na presidência da República, congelou todos os depósitos bancários de pessoas físicas e jurídicas. O Brasil estava sem dinheiro!
A gente teve de improvisar. Eu sumi da editora, peguei o carro e conheci todas as livrarias do estado de São Paulo. Correndo atrás de dinheiro. Aproveitei para conhecer o pessoal também, mas estava fazendo caixa, trocando na hora, dando desconto.
Lembro que nesse momento o manuscrito do meu livro, Fundamentos da Química, estava pronto. Quando o Collor tirou todo o dinheiro da gente, a editora não podia pagar ninguém. Então, reuni os colaboradores e o livro foi feito na raça, todo digitado e montado internamente. Os desenhos foram feitos à mão, em nanquim.
E - Qual é a lembrança mais bonita que o senhor guarda da Moderna?
RF - O que sempre me emociona é pensar como a Moderna foi crescendo pouco a pouco, com juízo, junto com todos os colaboradores e fornecedores. Com isso, formamos uma família, conseguimos atravessar todas aquelas crises, alta do dólar, Plano Collor, inflação absurda. Não sei se tivemos sorte ou se foi resultado do trabalho. Só sei que foi uma trajetória difícil, mas muito bonita.